O fascismo do PT contra os médicos
LUIZ FELIPE PONDÉ
O PT está usando uma tática de difamação contra os médicos brasileiros 
igual à usada pelos nazistas contra os judeus: colando neles a imagem de
 interesseiros e insensíveis ao sofrimento do povo e, com isso, fazendo 
com que as pessoas acreditem que a reação dos médicos brasileiros é 
fruto de reserva de mercado. Os médicos brasileiros viraram os "judeus 
do PT".
Uma pergunta que não quer calar é por que justamente agora o governo 
"descobriu" que existem áreas do Brasil que precisam de médicos? Seria 
porque o governo quer aproveitar a instabilidade das manifestações para 
criar um bode expiatório? Pura retórica fascista e comunista.
E por que os médicos brasileiros "não querem ir"?
A resposta é outra pergunta: por que o governo do PT não investiu numa 
medicina no interior do país com sustentação técnica e de pessoal 
necessária, à semelhança do investimento no poder jurídico (mais 
barato)?
O PT não está nem aí para quem morre de dor de barriga, só quer ganhar 
eleição. E, para isso, quer "contrapor" os bons cidadãos médicos 
comunistas (como a gente do PT) que não querem dinheiro (risadas?) aos 
médicos brasileiros playboys. Difamação descarada de uma classe inteira.
A população já é desinformada sobre a vida dos médicos, achando que são 
todos uns milionários, quando a maioria esmagadora trabalha sob forte 
pressão e desvalorização salarial. A ideia de que médicos ganham muito é
 uma mentira. A formação é cara, longa, competitiva, incerta, violenta, 
difícil, estressante, e a oferta de emprego decente está aquém do 
investimento na formação.
Ganha-se menos do que a profissão exige em termos de responsabilidade 
prática e do desgaste que a formação implica, para não falar do desgaste
 do cotidiano. Os médicos são obrigados a ter vários empregos e a 
trabalhar correndo para poder pagar suas contas e as das suas famílias.
Trabalha-se muito, sob o olhar duro da população. As pessoas pensam que os médicos são os culpados de a saúde ser um lixo.
Assim como os judeus foram o bode expiatório dos nazistas, os médicos 
brasileiros estão sendo oferecidos como causa do sofrimento da 
população. Um escândalo.
É um erro achar que "um médico só faz o verão", como se uma "andorinha 
só fizesse o verão". Um médico não pode curar dor de barriga quando 
faltam gaze, equipamento, pessoal capacitado da área médica, como 
enfermeiras, assistentes de enfermagem, assistentes sociais, 
ambulâncias, estradas, leitos, remédios.
Só o senso comum que nada entende do cotidiano médico pode pensar que a 
presença de um médico no meio do nada "salva vidas". Isso é coisa de 
cinema barato.
E tem mais. Além do fato de os médicos cubanos serem mal formados, 
aliás, como tudo que é cubano, com exceção dos charutos, esses coitados 
vão pagar o pato pelo vazio técnico e procedimental em que serão 
jogados. Sem falar no fato de que não vão ganhar salário e estarão fora 
dos direitos trabalhistas. Tudo isso porque nosso governo é comunista 
como o de Cuba. Negócios entre "camaradas". Trabalho escravo a céu 
aberto e na cara de todo mundo.
Quando um paciente morre numa cadeira porque o médico não tem o que 
fazer com ele (falta tudo a sua volta para realizar o atendimento 
prático), a família, a mídia e o poder jurídico não vão cobrar do 
Ministério da Saúde a morte daquele infeliz.
É o médico (Dr. Fulano, Dra. Sicrana) quem paga o pato. Muitas vezes a 
solidão do médico é enorme, e o governo nunca esteve nem aí para isso. 
Agora, "arregaça as mangas" e resolve "salvar o povo".
A difamação vai piorar quando a culpa for jogada nos órgãos 
profissionais da categoria, dizendo que os médicos brasileiros não 
querem ir para locais difíceis, mas tampouco aceitam que o governo 
"salvador da pátria" importe seus escravos cubanos para salvar o povo. 
Mais uma vez, vemos uma medida retórica tomar o lugar de um problema de 
infraestrutura nunca enfrentado.
Ninguém é contra médicos estrangeiros, mas por que esses cubanos não 
devem passar pelas provas de validação dos diplomas como quaisquer 
outros? Porque vivemos sob um governo autoritário e populista.
 
Luiz Felipe Pondé, pernambucano, filósofo, escritor e ensaísta, 
doutor pela USP, pós-doutorado em epistemologia pela Universidade de Tel
 Aviv, professor da PUC-SP e da Faap, discute temas como comportamento 
contemporâneo, religião, niilismo, ciência. Autor de vários títulos, 
entre eles, "Contra um mundo melhor" (Ed. LeYa). Escreve às segundas na 
versão impressa de "Ilustrada".
Artigo publicado na Folha de S.Paulo, de 02.09.2013