Pergunte a Bill Gates qual ramo da atividade humana abriga o embrião
da próxima grande revolução tecnológica. Esqueça a internet, os
celulares, os games, a realidade ou a inteligência virtuais. A resposta é
a biotecnologia. O fundador da Microsoft acredita que esse campo
desempenha na atualidade papel semelhante ao exercido pela programação
de computadores no século 20.
Ou seja, concentra o que há de mais
instigante e potencialmente transformador no planeta. E o executivo,
entre os mais bem-sucedidos da história do capitalismo, argumenta:
“Hoje, se alguém quer mudar o mundo de forma radical, deve começar pelas
moléculas. Elas precisam do mesmo tipo de fanatismo amalucado,
característico dos jovens gênios que criaram a indústria dos PCs”.
Agora, pergunte a gigantes globais como DuPont, BP, Basf, Shell,
Monsanto, Bunge, Dow Chemical, Ely Lilly e Novozymes, além de fundos de
investimento, como Burrill & Company e Khosla Ventures, qual país
reúne condições excepcionais para abrigar parte expressiva dessa nova
fonte de inovações. A resposta é o Brasil.
Tal indicação
pode soar surpreendente, mas existem mais de 100 companhias brasileiras
de biotecnologia. A cada ano, mais de uma dezena de empreendimentos
desse tipo são criados. Não há estudos conclusivos, mas o governo
federal estima que essa área receba US$ 1 bilhão em investimentos por
ano. Além de crescente, esse núcleo de empresas introduz novidades
significativas no cenário corporativo nacional. Em primeiro lugar,
entrelaça os mundos da ciência e dos negócios. Dessa fusão, movida por
altas doses de pesquisa e conduzida por times qualificadíssimos de
profissionais, tendem a proliferar inovações em profusão. Ela funciona
como um propulsor, uma espécie de Big Bang para ideias e produtos
inusitados. Exemplos desse poder criativo são oferecidos há décadas de
maneira ininterrupta pelas indústrias de semicondutores,
telecomunicações (celulares, por exemplo), eletrônicos e materiais
avançados. Todas com os pés firmemente fincados em laboratórios.
Paralelamente, a formação das bioempresas no Brasil alimenta – e
fortalece – um ecossistema de negócios riquíssimo, embora ainda frágil
no país. Funciona assim: tudo começa nas universidades. Elas abrigam
incubadoras, onde são embaladas as jovens empresas ( as start ups) que,
não raramente, amadurecem e se associam a grandes conglomerados
nacionais e internacionais. Esse sistema é complementado por uma ampla
teia de financiamentos formada por angel investors (investidores anjos,
normalmente pessoas físicas) e venture capitalists (investidores de
risco), além de fundos públicos e privados de todos os portes. “Esse
modelo, que tem todos os ingredientes para estimular o empreendedorismo,
fundou o Vale do Silício, nos Estados Unidos. Agora, começa a ganhar
corpo entre nós”, diz Eduardo Emrich Soares, presidente da Fundação
Biominas, uma organização não governamental com sede em Belo Horizonte,
voltada para o fomento de negócios enraizados nas ciências biológicas.
Neste
ponto, é ilustrativo observar a gênese da empresa paulista Pele Nova.
Ela foi criada em 2003 por dois cientistas: a médica oncologista Fátima
Mrué e o médico especializado em bioquímica Joaquim Coutinho Netto.
Ambos trabalhavam como pesquisadores na Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto (FMRP), no campus da USP, no interior paulista. A dupla
desenvolveu um produto, o BioCure, feito do látex extraído da
seringueira. A inovação, uma membrana de borracha, funciona como um
tecido artificial. É empregado com sucesso na cicatrização de úlceras
crônicas e na regeneração de esôfagos e tímpanos perfurados. Atualmente,
a mesma matéria-prima (o látex) está sendo testada no desenvolvimento
de um gel antirrugas. Qual o resultado da iniciativa? A Pele Nova
acumula sete patentes depositadas no Brasil, Estados Unidos, Europa e
Japão.
A arquitetura financeira da empresa é outro fator
de interesse. Inicialmente, arrecadou R$ 4 milhões. Parte do valor foi
captada com investidores anjos. Entre eles, Ozires Silva, o
ex-presidente da Embraer e da Varig. Outro quinhão saiu de um fundo
semente (seed capital), o Returning Entrepreneur Investment Fund,
conhecido pela sigla REIF, da DGV Investment. Também aplicaram recursos
no negócio outras três empresas de venture capital. A Pele Nova
arrecadou mais R$ 2 milhões do Programa Primeira Empresa Inovadora
(Prime), mantido pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), ligada
ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Por conta de acordos de
confidencialidade, a start up não divulga o faturamento, mas estima-se
que gire em torno de R$ 3 milhões.
Por
Carlos Rydlewski, Rafael Barifouse e Alessandro Greco com reportagem de Karla Spotorno
Nenhum comentário:
Postar um comentário