Espécie de alter ego da autora, a narradora e personagem principal é batizada pelo pai com o nome curioso de Pátria. O homem, fervoroso adepto da revolução, se emociona ao saber que, pouco antes de sua filha nascer, Che cobriu a barriga de sua mãe com a bandeira cubana. Depois, ela deu à luz a menina.
Essa seria uma das partes autobiográficas das histórias contadas por Zoé, convidada a vir ao Brasil para a próxima edição da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). Em recente entrevista publicada na internet, ela contemporiza: "O livro é bastante autobiográfico, o personagem tem muito de mim, mas é um romance". De acordo com a autora, a primeira parte tem a ver com um período precário que viveu em Cuba entre 1993 e 1994. A segunda mescla a sua vivência fora do país à de outras pessoas que conheceu.
Na ilha caribenha, Pátria se sente oprimida e sem liberdade. Ela muda de nome e passa a se chamar Yocastra - um híbrido de Jocasta com Cassandra - porque o primeiro homem por quem se apaixona não queria fazer amor com a Pátria. Ele é mais velho, tem pinta de intelectual e escritor de caráter duvidoso. Os dois vivem vários anos juntos e se casam em uma manobra manipulada - até ela descobrir que o marido é uma farsa, um opressor. Adulta, a personagem incorre no mesmo erro em Paris, com consequências ainda mais nefastas.
Tentando fazer uma alegoria com a história que relata, Zoé nomeia esse primeiro marido como Traidor. A maioria dos personagens traz no nome uma carga embutida: a amiga Gusano (verme, na tradução exata; delator, na linguagem figurada em Cuba), o amigo Lince, o amante Niilista, o Inseto Cubano. Aída, a mãe, é reconhecida como "a ida", em razão de um período em que entra em um estado emocional letárgico e sem memória.
Em Paris, reflete o sofrimento que sulca o coração, a psique e as emoções dos exilados. O romance ganha ritmo acelerado, de suspense e surpresas definidoras. Ali Yocastra vive os melhores e últimos anos de sua mãe. Faz amigos e se casa pela segunda vez com um cubano que, mais tarde, surpreenderá para o mal. Infeliz, sonha com a chegada de seu verdadeiro amor, o Niilista, preso político.
"O Todo Cotidiano"
Zoé Valdés Trad.: Ari Roitman e Paulina Wacht Benvirá, 320 págs., R$ 34,90 / BB+
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