quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Educação. Impressão de que se chegou ao futuro sem sair do passado.


A pedagogia da marquetagem

Elio Gaspari 

Brasília quer comprar 300 mil tablets, e o Cazaquistão, terra de Borat, 83 mil, mas NY comprou só 2.000
A compra de 300 mil tabuletas (equipamento também conhecido como "tablet") para estudantes da rede de ensino público nacional poderá ser a última encrenca da gestão do ministro Fernando Haddad, ou a primeira de Aloizio Mercadante. O repórter Luciano Máximo informa que falta pouco para que o governo federal ponha na rua o edital de licitação para essa encomenda.

Governos que pagam mal aos professores, que não têm programas sérios de capacitação dos mestres, onde as escolas estão caindo aos pedaços, descobriram que a compra de equipamentos eletrônicos é um bálsamo da pedagogia da marquetagem. Cria-se a impressão de que se chegou ao futuro sem sair do passado.


O governo de Pernambuco licitou a compra de 170 mil tabuletas, num investimento global de R$ 17 milhões. A Prefeitura do Rio anunciou em outubro que tem um projeto para distribuir outras 25 mil. A de São Paulo contratou o aluguel de 10 mil ao preço de R$ 139 milhões. Felizmente, o negócio foi abatido em voo.

A rede pública de Nova York, com 1,1 milhão de estudantes, investiu apenas US$ 1,3 milhão, numa experiência que colocou 2.000 iPads nas mãos de professores e de alunos de algumas escolas. Já a cidade mineira de Itabira (12 mil jovens na rede pública) comprou 3.000 laptops, num investimento de US$ 573 mil.
Na Índia, onde se fabricam tabuletas simples por US$ 35, existe um projeto piloto para 100 mil alunos num universo de 300 milhões de estudantes. Se tudo der certo, algum dia distribuirão 10 milhões de unidades. Na Coreia, o governo planeja colocar tabuletas nas mãos de todas as crianças do ensino fundamental. Lá, a garotada tem jornadas de estudo de 12 h diárias.

O projeto de Pindorama parece-se mais com o do Cazaquistão do companheiro Borat, onde se prevê a compra de 83 mil tabuletas até 2020.

Encomendas milionárias de computadores ou tabuletas para a rede pública são apenas compras milionárias, com tudo o que isso significa. Se a doutora Dilma quiser, pode pedir as avaliações técnicas que porventura existam do programa federal "Um Computador por Aluno".

Com quatro anos de existência, o UCA tem muitos padrinhos e fornecedores (150 mil máquinas entregues e 450 mil encomendadas por Estados e municípios). Nele, algumas coisas deram certo. Outras deram errado, ora por falta de treinamento dos professores, ora pela compra de equipamentos condenados à obsolescência.
Uma boa ideia não precisa desembocar em contratos megalomaníacos que terminam em escândalos. Se um cidadão que cuida do seu orçamento não sabe qual tabuleta deve comprar, o governo, que cuida da Bolsa da Viúva, deve ter a humildade de reconhecer que não se deve encomendar 300 mil tabuletas, atendendo a fabricantes que não conseguem produzir máquinas baratas como as indianas ou versáteis como as americanas, as japonesas e as coreanas.

Se esses equipamentos só desembarcarem em cidades e escolas onde houver banda larga e professores devidamente capacitados, tudo bem. Se o que se busca é propaganda, basta comprar vinte tabuletas, chamar a equipe de marqueteiros que faz filmes para as campanhas eleitorais e rodar o video. Consegue-se o efeito e economiza-se uma montanha de dinheiro.

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