domingo, 13 de novembro de 2011

A divisão do Pará. Não existe almoço de graça


Como disse o economista: There's no such thing as a free lunch

O problema.
É surpreendente como essa discussão sobre a divisão do Estado do Pará veio em péssimo momento. Lamento muito, mas os paraenses sofrem um verdadeiro bombardeio sobre um tema que dificilmente conseguem assimilar e menos ainda entender cabalmente.
Introduzir na vida cotidiana de uma população que vive em mais de 40% abaixo da linha da pobreza ou com menos de R$140,00 por mês, uma discussão que presume ser geopolítica, estratégica, e que vai a afetar profundamente a vida dos paraenses, é de uma perversidade que não tem tamanho. Mas, será que vai a afetar a vida mesmo da população?
Os melhores “cases” de sucesso para o debate.
Os exemplos para explicar o assunto em debate são tantos e tão esdrúxulos que recém hoje comecei a reconhecer experiências internacionais de partilha de territórios que nunca estudei nem me interessaram. Um dia é Canadá grande e poderoso, Estados Unidos, uma grande nação que convive muito vem com seus 51 Estados e ainda mais, anexou Porto Rico que é feliz como estado associado (segundo dados dos próprios Estados Unidos). Sem pensar nos exemplos contrários de países como a Rússia que se fragmentou em meio de fortes lutas separatistas que ainda não se resolvem. Dos dois lados temos belos exemplos para justificar a divisão ou para sugerir a unidade da região amazônica.
Descendo para o Brasil, os exemplos também são muito interessantes. De lado a lado temos exemplos abundantemente utilizados pelos defensores de um e outro lado da briga.
Tocantins é o paradigma dos partidários da divisão. Um estado empreendedor, onde claro 80% da população é de fora do estado e que para se implantar teve que destruir mais de 80% da sua biodiversidade e sua floresta nativa, o ativo ambiental, fator verdadeiramente estratégico na construção de um novo modelo de desenvolvimento para a Amazônia.;
Outro exemplo do lado oposto à divisão é o Estado de alagoas, pequeno estado com indicadores sociais que alarmam pela sua precariedade, que revelam que é um dos estados com o pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil.
Quer outro exemplo? O Território do Grão-Pará. Foi uma das capitanias da América Portuguesa, integrando inicialmente o Estado do Grão-Pará e Maranhão, juntos poderiam ter sido uma potência, mas veja aí no que deu. Maranhão comandado pela elite dos Sarney, que de um dia para outro se tornaram em paradigma de políticos honestos, democráticos e desenvolvimentistas, apoiados no seu poder, fortemente pela elite de esquerda brasileira que assumiu o poder para se enriquecer os melhores amigos do poder central.
A maior parte do debate se sustenta em exemplos que saíram de outras realidades, que nada tem a ver com a história do Pará’ ou da Amazônia que pouco podem servir de paradigmas para enriquecer a discussão.
Tamanho não é documento. Veja o caso do território de Gibraltar (“Peñon de Gibraltar”) uma pequenha colônia britânica (de apenas 6 Km2) situada na Província de Cádiz, Andaluzia, Espanha. A colônia permanece ocupada pelo Reino Unido desde 1704.
As Nações Unidas tem chamado em repetidas oportunidades aos governos de Espanha e Reino Unido a terminar com esta situação colonial e reintegrar o território à seus legítimos donos, Espanha, mas essa mesma pedra é um dos territórios mais prósperos e estáveis no poder da Inglaterra e a maioria da população quere continuar sendo colônia da Inglaterra.Essas experiências tem algo a ver com a nossa realidade?
Os atores do debate e o preço pela falta de Estado e de Poder.
Caros leitores deste blog: Essa discussão é um debate de elites que não chega ao conjunto do povo. Ainda nem sei como se concretizará esse processo de construção do novo modelo, de onde sairá essas enormes quantidades de investimentos anunciados pelo repasse do Fundo de Participação dos Estados (FPE), sem falar das empresas, recursos minerais, e, como já foi comentado, o maior patrimônio com que conta o Estado do Pará, onde ficarão seus ativos ambientais.
Essa divisão, como mínimo requer redefinição de linhas geográficas, estradas, novos caminhos, deslocamentos populacionais. Em síntese um empreendimento do tamanho do que foi feito quando se realizou a mais contemporânea invasão da Amazônia, na década de 1970, pelos governos militares, com o lema de “ocupar para não entregar”. Esse pode ser a versão moderna da nova ocupação da Amazônia.
O marketing e os novos nichos dos publicitários desempregados.
A ousadia dos marqueteiros é tão grande que com esse plebiscito inauguraram um nicho nunca antes explorado, em condições da mudança tecnológica em curso, como é a atual tecnologia de informação e comunicação existente.
Este é um verdadeiro jogo de marketing de publicitários desempregados ou preparando-se para um novo processo eleitoral mais complexo, em 2012.
É uma verdadeira tristeza ver como marqueteiros que pouco conhecem a realidade da Amazônia entraram nesse jogo, mas a população tudo aceita, acostumada a ser eco de qualquer política exógena, aceita passiva seu destino.
Esse é o preço que pagamos todos pela falta de uma política que assuma a condução do desenvolvimento do estado e porque não do Brasil? Algum ministro do governo federal tem manifestado preocupação pela nova partilha que se provoca em uma região tão importante como o estado do Pará. Ninguém meu irmão, ninguém meu mano. 


TUDO ISSO EM UM MÊS! QUEM DIRIA. HOUVE PARTILHAS QUE DURARAM SÉCULOS E AINDA NÃO SÃO RESOLVIDAS. NO PARÁ, A TV E OS MARQUETEIROS QUEREM PRODUZIR UMA DEFINIÇÃO EM UM MÊS. 
Alguém terá que pagar por isto.
There's no such thing as a free lunch

O que ficou da ocupação de um pedaço da Amazônia. 

Terra de ninguém
(Celso Cavalcanti)

“Ocupar para não entregar”. Era essa a palavra de ordem da ditadura quando, nos anos 1970, incentivou brasileiros de todos os cantos a deixar sua terra e tentar fortuna na Amazônia. Foi nessa época que, ainda menino, Dinho saiu do Paraná com seus pais para viver em Rondônia. Eles se fixaram na região conhecida como Ponta do Abunã, uma faixa na divisa com o Acre e o Amazonas, a menos de 10 km da fronteira com a Bolívia.


Os anos passaram. A floresta deu lugar a pastagens; pouquíssimos enriqueceram. Dinho virou chefe de família e líder de assentamento. Depois de quase 40 anos, o lugar ainda não tem luz elétrica, água encanada ou telefone. Posto médico, delegacia, banco, cartório...nem pensar. Terra de ninguém. Pra garantir o sustento, Dinho montou uma banca na feira de Vista Alegre, um distrito a 70 km de sua casa.

Na última sexta-feira de maio, ele descarregava os legumes e verduras do carro quando foi assassinado. Cinco tiros a queima roupa, na frente da mulher e dos dois filhos pequenos. O pistoleiro saiu caminhando. Dinho denunciava a atuação de madeireiros ilegais na região.


Nesta semana estive no assentamento. Uma comitiva de jornalistas e parlamentares em busca de informações sobre os conflitos na área. Quase três horas de Brasília a Porto Velho em avião da FAB e outros 50 minutos num bimotor até a Ponta do Abunã. A equação é clara: de um lado, os poderosos que enchem os bolsos explorando a natureza e a miséria alheia; do outro, os que atenderam ao chamado do governo e ocuparam um pedacinho de terra nos confins do “pulmão do mundo”.


Retornamos a Brasília no mesmo dia. A sensação era de estar vindo de outro país. Cheguei em casa, abracei meus filhos e minha mulher, e me lembrei que Dinho nunca mais vai voltar pra casa e abraçar sua família.

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