No
final do ano passado, a Organização para Cooperação dos Países
Desenvolvidos (OCDE) divulgou a quarta edição de seu Programa de
Avaliação Internacional de Estudantes, o Pisa. O Brasil melhorou pouco e
continuou entre as 12 últimas posições no ranking de 65 países. Do
outro lado do mundo, a cidade chinesa de Xangai e a Coréia do Sul
figuraram entre os primeiros colocados ao lado da sempre exemplar
Finlândia. Na América Latina, o primeiro lugar é do agora conturbado
sistema educacional chileno. O que leva estes países a estas posições?
A
presidente da Comunidade Educativa, Beatriz Cardoso, é uma das
brasileiras que melhor pode responder a esta pergunta. Ela passou dez
dias em cada um destes países para colaborar com a série especial
“Destino: Educação”, que estreia na próxima segunda-feira no Canal
Futura em parceria com o Sesi e vai ter também um capítulo sobre o
Canadá e outro sobre o Brasil.
Se
antes de embarcar já achava que o ranking era um dado isolado que devia
ser visto ao lado de outros fatores, na volta está convicta de que,
sozinho, ele “afunila” e descarta a reflexão. “O ranking tem que
existir, mas não pode ter a dimensão que ganha no Brasil”, diz ela. Por
quê? A resposta está na descrição que faz dos primeiros colocados na
entrevista a seguir.
iG: É possível tirar lições da educação de Xangai, Coreia do Sul, Finlândia e Chile para o Brasil?
Beatriz:
O objetivo era justamente contextualizar o sistema de ensino que gera
estes primeiros lugares no Pisa e desmistificar o ranking. Fomos tentar
entender qual a sociedade em que aqueles resultados aparecem e o que
está dando base para a escola funcionar daquela forma. Não fomos buscar
receita, mas compreensão do que está em jogo por trás do resultado e, aí
sim, se existem elementos para o Brasil refletir.
iG: O que leva estes países as primeiras posições?
Beatriz:
É a base cultural e socioeconômica. Em cada país por um motivo, mas é a
pressão ou a cultura geral que levam a educação a ser tão importante.
Isso nos faz pensar na nossa base, no que todos nós somos e queremos
ser.
iG: Qual país deixou a melhor impressão?
Beatriz:
A Finlândia me marcou inteira. Acho que é onde a gente tem mais a
aprender. Lá entendemos porque o sistema responde tão bem às
necessidades de todos: pela visão igualitária. Eles apostam em todos os
cidadãos como pessoas competentes, independente do que eles queiram
fazer. As carreiras técnicas são tão bem recebidas quanto as acadêmicas,
porque são fundamentais para a sociedade da mesma forma. Há uma
parceria muito grande com os pais, com os sindicatos, todo o sistema é a
favor da melhor escola possível para todos.
iG: As escolas seguem um modelo massificado como no Brasil ou são diferentes umas das outras?
Beatriz:
Lá o professor tem liberdade para fazer o que quiser. A palavra que me
ocorre para resumir o sistema finlandês é confiança. O professor confia
nos alunos e nas famílias e todos têm confiança de que o professor é
extremamente competente. Em uma entrevista a professora diz que a
obrigação dela é fazer com que o sistema crie condições para todos
aprenderem, não só ela. Eles têm essa percepção de que cada um é
importante.
iG: Como um país com sociedade tão diferente como a Coréia do Sul também consegue estar entre os primeiros?
Beatriz:
Eles também têm uma base cultural muito forte, mas ali o que põe a
educação em destaque na sociedade é a competição. Todo mundo no Brasil
cita o exemplo da revolução que a Coréia do Sul promoveu na Educação,
mas de que maneira? O compromisso com a educação é muito evidente, mas a
competitividade chegou a um ponto extremo. Todo mundo quer ir para a
melhor faculdade do mundo. Não é à toa que os índices de suicídio entre
os estudantes já são altíssimos. A situação chegou a um ponto que o
governo hoje tenta amenizar a pressão. As escolas estão proibidas de dar
aulas depois da meia-noite para que eles descansem. Se deixar, nem
dormem.
iG: O governo estabeleceu um limite máximo de tempo de estudo?
Beatriz:
É para que não estudem o dia inteiro. Eles já vão para a escola pública
às 7h30 da manhã e ficam até 4h da tarde, mas todo mundo vai para a
particular depois disso e fica até tarde da noite estudando. As famílias
cobram de forma muito pesada o resultado e as escolas focam nos
melhores, todos querem estar entre os melhores. Enquanto falávamos com
um bom aluno, o diretor estava visivelmente nervoso porque, para ele,
aqueles minutos eram preciosos, um talento não deveria estar perdendo
tempo dando entrevista.
iG: Nesta sociedade, os professores também tem autonomia?
Beatriz:
Têm muita autonomia porque são extremamente preparados. A disputa para
ser professor é enorme, uma vez que ele consegue a vaga é o dono da sua
cadeira. Mas a competição perversa o atinge também. A pressão é enorme.
iG: Qual a grande motivação na China?
Beatriz:
Esse é um caso muito interessante e complexo, toda a cultura deles é
diferente para a gente. Todo mundo vai para a faculdade, não sei o que
vai acontecer daqui 15 anos. A pressão é parecida com a da Coréia, mas
ali é pela responsabilidade que o menino tem de cuidar da família. São
todos filhos únicos e não existe sistema de previdência. A segurança
financeira dos pais e avós depende do sucesso do estudante. Isso gera
responsabilidade e cobrança bem grandes. Além disso, a base cultural é
totalmente diferente. Não existe namorar, por exemplo. Não faz parte da
rotina sair para passear, eles só pensam na universidade. Vão para casa
depois da aula e continuam estudando.
iG:
Outro país visitado pela sra., o Chile, tem passado por protestos de
estudantes. O sistema merece ter recebido a melhor colocação da América
Latina?
Beatriz:
O Chile foi o primeiro que visitamos, em fevereiro, antes dos
protestos, mas já tínhamos a sensação de que o modelo era insustentável.
A colocação, que nem é tão boa (eles são o 45º lugar, se destacam pelo
primeiro lugar na América Latina) se deve muito pelo fato de metade das
matrículas serem do sistema particular. No Brasil, cerca de 90% dos
estudantes estão no sistema público. Efetivamente a grande questão que
apareceu no Chile foi a desigualdade, quem é pobre tem um tipo de
escola, quem é rico, outro. Há conquistas, uma das coisas mais
interessantes é o pacto pela educação, nós percebemos que eles colocam
isso acima de um governo ou de outro, mas também não estão tão bem
assim.
iG: Depois de conhecer esses lugares, qual papel a sra. atribui a listas como o Pisa?
Beatriz:
O ranking é inevitável, não pode ser proibido, mas não pode ter a
dimensão que ganha no Brasil. Na Finlândia, por exemplo, ninguém está
preocupado com isso, o ranking não é sequer mencionado. Esta coisa de
publicar lista de escola foca a avaliação no lugar errado. A prova é uma
das medidas do sistema. Olhar só o Pisa, assim como o Enem, é afunilar o
julgamento. Tem muita coisa por trás dos números.
Clique aqui e acesse a publicação original da notícia
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Fonte: Ig Educação |
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sábado, 15 de outubro de 2011
Educação - Chile no primeiro lugar da América Latina. Brasil, nos últimos 12 lugares dentre 65 países.
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