O Brasil está vacinado contra o neoliberalismo, ela nos disse; Dilma
teme, porém, que a crise mundial torne agências de risco mais
importantes do que o povo
"A senhora, presidenta Dilma, foi corajosa ao escolher participar do Fórum Social Temático de Porto Alegre e não do Fórum Econômico de Davos", disse João Pedro Stédile, do MST, no encontro da presidente com os organizadores do fórum, na capital gaúcha, no fim de janeiro.
Pouco antes, Dilma Rousseff recebeu Leonardo Boff, sua mulher, Márcia Miranda, e a mim.
Boff manifestou ceticismo diante do texto da ONU para a Rio+20, que reunirá na capital carioca, em junho, chefes de Estado e a Cúpula dos Povos, evento da sociedade civil.
O "esboço zero", o texto da ONU, é inconsistente. Ele fala em pobreza, mas evita abordar a desigualdade social. Ele alardeia também a "economia verde". Trata-se de mera falácia para evitar atacar a principal causa da devastação ambiental: o atual modelo predatório de desenvolvimento, baseado na prevalência da riqueza privada sobre os direitos humanos e os direitos da mãe terra.
Às vésperas da viagem da presidente a Cuba -além disso, o papa irá em março ao país-, aproveitei para fazer uma breve análise da conjuntura cubana, que passa por mudanças substanciais.
No encontro da presidente com 70 líderes de movimentos sociais, enfatizou-se o repúdio às mudanças no Código Florestal, aprovadas no Senado. Reivindicaram-se o veto à anistia aos produtores rurais responsáveis por crimes ambientais, a não redução da reserva legal e a exigência de desmatamento zero. Ao responder, Dilma disse que o Código Florestal "não será o dos sonhos dos ruralistas".
Dilma frisou que representa um projeto de governo, iniciado pelo ex-presidente Lula, cujo objetivo é reduzir a desigualdade social e imprimir qualidade aos serviços públicos, em especial à saúde, à educação e à habitação.
Acrescentou que, após o fracasso de governos anteriores e tendo em vista a crise europeia, "o Brasil está vacinado contra o neoliberalismo".
Para a presidente, só foi possível tirar da pobreza 40 milhões de brasileiros nos últimos nove anos graças ao modelo de desenvolvimento sustentável que combina crescimento econômico com distribuição de renda.
Neste momento, enquanto na Europa acontece uma "perda de direitos sociais" e a adoção de ajustes fiscais, declarou Dilma, o Brasil (país para o qual Davos olhou com uma ponta de inveja) adota uma política de subsídios a direitos fundamentais, como o acesso à moradia, e combina transferência de renda com qualificação dos serviços públicos.
Dilma considerou "uma barbárie" a desocupação das 1.700 famílias de Pinheirinho, em São José dos Campos (SP), e manifestou a esperança de que a Rio+20, sobretudo através da Cúpula dos Povos, apresente à crise global um novo paradigma, "um outro mundo possível".
Alertou ainda que o pós-neoliberalismo não pode coincidir com a pós-democracia.
Manifestou, assim, o temor de que medidas tomadas para superar a crise financeira mundial "torne as agências de risco econômico mais importantes do que os povos que elegeram seus governantes".
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