"Todo brasileiro já nasce sabendo conviver com as diferenças", diz a mensagem publicitária da Caixa, ilustrada por um garoto que veste uma camiseta com as cores de todos os times patrocinados pelo banco estatal. A Caixa não prega a tolerância por decisão própria, mas seguindo uma orientação do ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Edinho Silva. O menor dos problemas da campanha publicitária é que evidencia, uma vez mais, a apropriação partidária das estatais. O maior é que difunde um equívoco conceitual: a tolerância não é atributo inato de ninguém.
Guido Mantega, Alexandre Padilha e Fernando Haddad sofreram vaias e ofensas, respectivamente, num hospital, num restaurante e no teatro. A campanha de Edinho foi deflagrada como reação a ocorrências desse tipo, que atingem lideranças do PT. Os malcriados que se aproveitam do clima político nacional para constranger petistas só merecem desprezo: numa sociedade decente, políticos devem ter a liberdade de circular como cidadãos comuns sem serem importunados. Contudo o governo lembrou-se muito tarde da importância do amor –e finge não saber quem moveu o peão das brancas.
Nos tempos do mensalão, um assessor da deputada Erika Kokay (PT-DF) perseguiu Joaquim Barbosa em restaurantes de Brasília para ofendê-lo. Quando a blogueira cubana Yoani Sánchez visitou o Brasil, chusmas de militantes do PT e do PC do B foram orientados pela embaixada de Cuba a melar os lançamentos de seu livro. Um bando de militantes petistas impediu, pelo vandalismo, a realização de um debate com minha participação na Festa Literária Internacional de Cachoeira (BA). Tais episódios, entre tantos outros, tiveram como protagonistas grupos partidários organizados, não indivíduos isolados. O ódio era política oficial, antes da descoberta do amor.
A tolerância é um aprendizado democrático. Ela só prevalece se o outro não é visto como inimigo, mas como um de nós. A metáfora da Caixa é adequada, pois todos os times pertencem à mesma pátria: o futebol. Contudo, no poder, o lulopetismo ensinou o contrário disso. A pedagogia oficial do ódio assevera que o país se divide em "nós" e "eles". Mais: diz que "eles" não são brasileiros com opiniões políticas diferentes, mas estrangeiros ideológicos. Você será qualificado de racista se divergir das políticas raciais; de inimigo do povo, se contestar o populismo econômico; de agente das multinacionais, se apontar a ingerência partidária na Petrobras; de golpista, se criticar o governo. Na pátria que se confunde com o partido, dissentir equivale a trair.
A súbita irrupção do amor oficial não cancelou o ódio oficial. Dilma Rousseff insiste na fórmula binária dos "predadores internos" (leia-se: os corruptos) e dos "inimigos externos" (leia-se: a oposição) sempre que menciona a Petrobras. A palavra "golpismo" tornou-se marca registrada dos pronunciamentos do PT. A proposta de resolução partidária da corrente petista integrada pelo ministro José Eduardo Cardozo e pelo ex-ministro Tarso Genro denuncia um "golpismo econômico" que estaria materializado nas políticas de ajuste fiscal conduzidas por Joaquim Levy. Edinho é do amor, mas sua chefe e seu partido são do ódio.
Edinho é do amor? Com uma mão, a Caixa lançou sua nova campanha. Com a outra, prossegue sua antiga campanha de financiamento dos blogs oficialistas consagrados à difamação sistemática da oposição, dos críticos do governo e de juízes encarregados dos escândalos de corrupção. Jatos de puro ódio cintilam sob a película do amor.
Suspeito que, tipicamente, algum malcriado sugeriu que Mantega, Padilha ou Haddad se transfira para Cuba. É o avesso simétrico do que ensina há tanto tempo o lulopetismo. Os malcriados aprenderam um método, assimilaram uma linguagem. Dizem, agora, que o "estrangeiro" é o PT. De certo modo, o PT venceu.
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