FOLHA DE S. PAULO
Domingo, 26 de junho de 2011
RUBENS RICUPERO
Excelente desempenho da atividade
econômica só vai se sustentar se o Brasil encontrar uma solução para os
desafios do ambiente. Se a agricultura brasileira não
conseguir sustentar a impressionante trajetória das últimas décadas, será
devido à incapacidade de resolver com inteligência o desafio do meio
ambiente.
Talvez não haja na história econômica do
Brasil nenhum exemplo tão indiscutível de transformação de eficiência e
produtividade como na agropecuária. Essa modernização só se tornou possível
graças à pesquisa tecnológica, que erradicou o pessimismo sobre a agricultura
tropical.
A tecnologia, afirma-se, permitiria
expandir a produção sem devastar mais a floresta e o cerrado que restam. Os 70
milhões de hectares de pastagens degradadas poderiam servir de reserva à
expansão agrícola ou florestal.
Em teoria, tudo isso é verdade.
Na
prática, o que se vê é pouco. Sinais positivos como o aumento de
produção em proporção maior do que a expansão da área plantada são largamente
compensados pela destruição. De forma inexorável, a fronteira agrícola avança
rumo ao coração da floresta amazônica.
O choque da devastação em Mato Grosso
estimulada pelo projeto de lei aprovado na Câmara provocou a mobilização do
governo em verdadeira operação de guerra. O resultado foi pífio: a destruição
apenas se reduziu marginalmente.
Essa mesma desproporção entre esforços
de preservação e resultados precários, geralmente revertidos logo depois,
caracteriza o panorama de desolação em todas as regiões e em todos os biomas:
mata atlântica, caatinga, Amazônia, cerrado, árvores de
Carajás convertidas em carvão para o ferro-gusa.
As entidades do agro protestam que suas
intenções são progressistas.
Contudo o comportamento de parte
considerável de seus representados desmente as proclamações. Mesmo em Estado
avançado como São Paulo e lavoura rentável como a da cana, quantos recuperaram
as matas ciliares de rios e nascentes?
Tem-se a impressão de reeditar o debate
sobre o fim da escravatura.
Todos eram a favor, mas a unanimidade
não passava de ilusão.
É fácil concordar sobre os fins; o
problema é estar de acordo sobre os meios e os prazos. Sempre que se falava em
datas, a maioria
desconversava: o país não estava
preparado, era preciso esperar por futuro incerto e distante.
Em 1847, um agricultor esclarecido, o
barão de Pati de Alferes, se escandalizava com a aniquilação da mata atlântica
no manual prático que escreveu sobre como implantar uma fazenda de café:
"Ela mete dó e faz cair o coração aos pés daqueles que estendem suas
vistas à posteridade e olham para o futuro que espera seus sucessores".
De nada adiantou: o café acabou devido à
destruição dos solos. A joia da economia imperial deu lugar às cidades mortas
fluminenses e paulistas. Não foi só naquela época. No auge da pecuária no vale
do rio Doce, como lembra o ex-ministro José Carlos Carvalho, um hectare sustentava
2,8 cabeças de gado; hoje, mal chega a 0,6!
Produto do passado da erosão e da
secagem das nascentes, o processo agora se acelera por obra do aquecimento
global, que atingirá mais cedo e mais fortemente áreas tropicais como o Brasil.
Sem compatibilização entre produção e ambiente, o destino da agricultura será o
do suicídio dos fazendeiros fluminenses e do rio Doce.
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